Nasa pesquisa se humanos podem ir para Marte



Tony Phillips
Da Nasa


A Nasa tem um mistério a resolver: seres humanos podem ou não ir a Marte?

"É uma questão de radiação", diz Frank Cucinotta, do Projeto de Saúde de Radiação Espacial da Nasa, no Centro Espacial Johnson. "Sabemos as dimensões da radiação existente no espaço, à nossa espera entre a Terra e Marte, mas não estamos certos de como o corpo humano reagirá a ela".

A Nasa vem enviando astronautas ao espaço, regular se bem que não ininterruptamente, já há 45 anos. Excetuadas algumas viagens à Lua, eles jamais passaram muito tempo longe da Terra. O espaço distante está repleto de prótons de clarões solares, raios-gama de buracos negros recém-nascidos e raios cósmicos de estrelas explodindo. Uma longa viagem a Marte, sem que haja um planeta posicionado para bloquear ou defletir essa radiação, será uma nova aventura.

A Nasa pondera o perigo de radiação em unidades relativas ao risco do câncer. Um homem norte-americano não-fumante na casa dos 40 anos tem uma (imensa) chance de 20% de um dia morrer de câncer. Isso vale para homens que permanecerem na Terra. Caso viajem a Marte, o risco decerto aumenta.

A dúvida é definir o quanto.

"Não estamos certos", diz Cucinotta. De acordo com um estudo conduzido em 2001 com pessoas expostas a grandes doses de radiação -ou seja, sobreviventes da bomba atômica de Hiroshima e, ironicamente, pacientes de câncer que passaram por radioterapia-, o risco de câncer adicional envolvido em uma missão a Marte com mil dias de duração ficaria entre 1% e 19%. "A resposta mais provável é de 3,4%", diz Cucinotta, "mas as margens de erro são imensas". Para as mulheres, o risco aumenta ainda mais. "Devido aos seios e aos ovários, o risco para as astronautas é quase duas vezes maior do que para os homens".

Os pesquisadores que conduziram o estudo presumiram que a espaçonave que será usada na missão a Marte será construída "principalmente de alumínio, como os velhos módulos de comando das missões Apollo", diz Cucinotta. O revestimento metálico da espaçonave absorveria cerca de metade da radiação que a atingiria.

"Se o risco adicional estiver na casa de uns poucos pontos percentuais, não há problema. Poderíamos construir uma espaçonave de alumínio e partir para Marte". (O alumínio é um dos materiais preferidos para a construção de espaçonaves, porque seu peso é baixo, sua resistência é elevada e os engenheiros estão familiarizados com o metal devido às décadas de uso do produto no setor aerospacial.)

"Mas se o risco adicional for de 19%, um astronauta na casa dos 40 anos teria um risco básico de câncer de 20% e mais 19% gerado pela radiação, o que resulta em 39% de chance de desenvolver um câncer terminal quando ele voltar à Terra. Isso não é aceitável".

As margens de erro são elevadas, diz Cucinotta, por bons motivos. A radiação espacial é uma mistura única de raios gama, prótons de alta energia e raios cósmicos. Detonações de bombas atômicas e tratamentos de câncer, a base de muitos estudos realizados na Terra, não substituem a experiência real.

A maior ameaça aos astronautas a caminho de Marte são os raios cósmicos galácticos, ou RCG, para resumir. Trata-se de partículas aceleradas até velocidade próxima à da luz por explosões de supernovas distantes. Os RCG mais perigosos são os de núcleos fortemente ionizados como o do Fe+26. "Eles têm muito mais energia (milhões de megavolts) do que os prótons típicos acelerados pelos clarões solares (dezenas a centenas de megavolts)", aponta Cucinotta. Os RCG penetram o revestimento das espaçonaves e a pele humana como se fossem balas de canhão infinitesimais, rompendo os feixes de moléculas de DNA, danificando genes e matando células.

Os astronautas raramente tiveram de enfrentar uma dose elevada desses RCG nas profundezas do espaço. Tomemos por exemplo a Estação Espacial Internacional: ela está em órbita a apenas 400 quilômetros da superfície da Terra. O corpo do nosso planeta, dada sua proximidade, intercepta cerca de um terço dos RCG antes que eles atinjam a estação espacial. Outro terço termina desviado pelo campo magnético terrestre. Os astronautas que tripulam os ônibus espaciais desfrutam de proteção semelhante.

Os astronautas do projeto Apollo que viajaram à Lua absorveram doses maiores -cerca de três vezes superiores à radiação que atinge a estação espacial-, mas apenas nos poucos dias de duração de sua viagem entre a Terra e a Lua. Os RCG podem ter causado danos aos seus olhos, aponta Cucinotta. A caminho da Lua, as tripulações das espaçonaves Apollo reportaram ter visto clarões de raios cósmicos em suas retinas, e agora, muitos anos mais tarde, alguns dos astronautas sofrem de cataratas. Mas, isso excetuado, os efeitos não parecem ter sido sérios. "Alguns dias de viagem espacial aparentemente não representam risco de segurança", conclui Cucinotta.

Mas os astronautas em viagem a Marte estarão no espaço por um ano ou mais. "Não podemos ainda estimar, de maneira confiável, o que os raios cósmicos podem causar em uma exposição tão longa", diz o cientista.

Para descobrir, o novo Laboratório de Radiação Espacial da Nasa (NSRL), parte do Laboratório Nacional Brookhaven, em Nova York, foi inaugurado em outubro de 2003. "No NSRL temos aceleradores de partículas que podem simular os raios cósmicos", explica Cucinotta. Os pesquisadores expõem células e tecidos de mamíferos aos feixes de partículas, e estudam detalhadamente os danos sofridos. "O objetivo é reduzir a incerteza em nossas estimativas de risco a apenas alguns pontos percentuais, até 2015".

Assim que os riscos forem conhecidos, a Nasa pode decidir que espécie de espaçonave deve construir para a missão. É possível que materiais comuns de construção, como o alumínio, bastem. Mas caso não o sejam, "já identificamos algumas alternativas", diz.

Por que não uma espaçonave feita de plástico?

"O plástico é rico em hidrogênio -elemento que trabalha bem na absorção de raios cósmicos", explica Cucinotta. Por exemplo, o polietileno, material do qual são feitos sacos de lixo, absorve 20% mais raios cósmicos que o alumínio. Uma forma reforçada de polietileno desenvolvida pelo Centro de Vôo Espacial Marshall é 10 vezes mais forte que o alumínio, e também mais leve. Esse pode ser o material preferido para construção de espaçonaves no futuro, caso seu preço caia o suficiente. "Mesmo que não construamos a nave inteira de plástico", diz Cucinotta, "poderíamos usar o material para proteger as áreas essenciais, como o alojamento dos tripulantes". De fato, isso já acontece no interior da estação espacial.

Se o plástico não servir, talvez seja preciso usar hidrogênio puro. Em comparação com base no peso, o hidrogênio líquido bloqueia 2,5 vezes mais raios cósmicos que o alumínio. Alguns projetos avançados de espaçonaves requerem grandes tanques de combustível repletos de hidrogênio líquido, de modo que "poderíamos proteger a tripulação instalando os tanques de combustível em volta de seus alojamentos", especula Cucinotta.

Seres humanos poderão ir a Marte? Cucinotta acredita que sim. Mas primeiro "temos de descobrir que volume de radiação nossos corpos podem enfrentar, e que espécie de espaçonave será preciso construir". Em laboratórios de todo o país, a pesquisa já começou.



Tradução: Paulo Migliacci

 

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