Físicos montam supercomputador global

SALVADOR NOGUEIRA
da Folha de S.Paulo

Se a inspiração para a criação da internet deveu sua existência à física nuclear --mais especificamente à ameaça de um ataque nuclear capaz de derrubar os meios de troca de informação entre as instituições governamentais americanas--, chegou a hora de pagar a dívida.

Pesquisadores espalhados pelo mundo estão desenvolvendo o que poderia ser visto como um supercomputador global, capaz de revolucionar a pesquisa em física de partículas. E o Brasil também está envolvido.

No final do mês passado, começou a operar no Instituto de Física da USP o Sprace (sigla em inglês para Centro Regional de Análise de São Paulo). Trata-se de um centro de computação que vai participar de um projeto gigante de processamento de dados obtidos por aceleradores de partículas --o primeiro nó operacional do chamado HEP-Grid no país.

O tal Grid para Física de Alta Energia, na tradução para o português, foi criado para processar o resultado de grandes experimentos. Eles são conduzidos hoje no Fermilab (Laboratório Acelerador Nacional Fermi), em Chicago, Illinois (EUA). Futuramente, ocorrerão no LHC (Grande Colisor de Hádrons), o maior acelerador de partículas do mundo, atualmente em fase de construção no Cern (principal centro europeu de física de partículas).

A idéia é criar uma enorme rede de computadores para agrupar a capacidade de várias unidades espalhadas pelo globo no processamento dos dados captados pelos sensores dos aceleradores.

"A idéia de processamento distribuído que está por trás do HEPGrid é similar àquela empregada pelo Seti@Home", explica Sérgio Novaes, do Instituto de Física Teórica da Unesp, um dos coordenadores do Sprace.

O Seti@Home era um programa do tipo "descanso de tela" para computadores pessoais que processava sinais do radiotelescópio de Arecibo, em Porto Rico, procurando por sinais de comunicação de civilizações alienígenas. Fornecido gratuitamente via web (setiathome.ssl.berkeley.edu), ele analisou uma montanha impressionante de dados, com a colaboração dos internautas.

"No entanto, no HEP-Grid estão envolvidos procedimentos bastante distintos", prossegue Novaes. "O Seti utiliza o tempo ocioso de uma grande quantidade de computadores pessoais para processar pacotes de informação. Já na arquitetura Grid, cada uma das unidades pode submeter programas a serem rodados em outras unidades que estejam com capacidade ociosa. Ao mesmo tempo, cada unidade, estando ociosa, pode receber pedido para executar tarefa de outra unidade."

A Fapesp (Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo) investiu até agora R$ 500 mil no centro paulista instalado na USP. Ele já está conectado a outros no sul dos EUA, no México e na Índia. Por ora, a equipe está trabalhando numa simulação de processamento de dados de um experimento chamado DZero, a ser conduzido no Fermilab. "Esse tipo de simulação é fundamental para a correta interpretação das observações", afirma Novaes.

Os centros do HEP-Grid estão divididos em três níveis. O de nível 0 é a grande central de processamento, localizada no Cern. Os de nível 1 são nacionais, e os de nível 2, regionais. O Sprace pertence ao nível 2, subordinado ao centro nacional do HEP-Grid, que está sendo montado na Uerj (Universidade Estadual do Rio de Janeiro) e ainda não entrou em rede.

 

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