Cientistas descobrem novo estado da matéria

Patrick Barry e Tony Phillips
Da Nasa


Aprendemos ainda no primeiro grau. Existem três estados da matéria -sólido, líquido e gasoso.

Mas isso sequer nos conta a metade da verdade. O número de estados existentes é de no mínimo seis: sólido, líquido, gasoso, plasmático, condensado Bose-Einstein e um novo estado conhecido como "condensado fermiônico", que acaba de ser descoberto por pesquisadores financiados pela Nasa. "É um momento muito emocionante", diz Debora Jin, física da Universidade do Colorado e do Instituto Nacional de Padrões e Tecnologia (NIST) norte-americano, que liderou a equipe científica que produziu o primeiro condensado fermiônico, em dezembro de 2003. "Minha equipe esteve trabalhando com enorme afinco, nos últimos meses. A emoção de um grande avanço e a competição para sermos os primeiros foram grandes incentivos".

A maior parte dos alunos de segunda série é capaz de recitar as propriedades dos sólidos, líquidos e gases. Os sólidos resistem à deformação. São rígidos e podem ser esmagados. Os líquidos fluem, são difíceis de comprimir e assumem a forma de seu recipiente. Os gases são menos densos, são fáceis de comprimir e não só assumem a forma de seu recipiente como se expandem para preenchê-lo completamente.

O quarto estado da matéria, o plasmático, se assemelha ao gasoso, e é composto de átomos que se dividiram em íons e elétrons. O Sol é feito de plasma, e o mesmo vale para a maior parte da matéria presente no universo. O plasma em geral tem temperatura muito elevada, e é possível conservá-lo em frascos magnéticos.

O quinto estado da matéria, o condensado Bose-Einstein (BEC), descoberto em 1995, aparece quando cientistas refrigeram partículas conhecidas como bósons a temperaturas muito baixas. Os bósons refrigerados se fundem para formar uma superpartícula unificada que se comporta mais como onda do que como um grão normal de matéria. Os BEC são frágeis, e a luz viaja muito lentamente em seu interior. Agora, temos os condensados fermiônicos, tão novos que a maior parte de suas propriedades básicas continua desconhecida. Certamente são frios. Jin criou a substância ao resfriar uma nuvem de 500 mil átomos de potássio-40 para menos de um milionésimo de grau acima do zero absoluto. E eles provavelmente fluem sem viscosidade. Mas, isso excetuado, os pesquisadores estão apenas começando a descobrir as demais características.

"Quando se descobre um novo estado da matéria", aponta Jin, "sempre demora um pouco para compreendê-lo".

Os condensados fermiônicos são parentes do BEC. Ambos são compostos de átomos que coalescem, em temperaturas muito baixas, para formar um objeto único. Em um BEC, os átomos são bósons. Em um condensado fermiônico, os átomos são férmions.

Qual é a diferença?

Os bósons são sociáveis, gostam de se reunir. Como regra geral, qualquer átomo com um número par de elétrons mais prótons mais nêutrons é um bóson. Assim, por exemplo, os átomos comuns de sódio são bósons, e podem se fundir e criar um BEC.

Os férmions, por outro lado, são anti-sociais. O "Princípio de Exclusão de Pauli", um dos fundamentos da mecânica quântica, os proíbe de se reunirem no mesmo estado quântico. Qualquer átomo com número ímpar de elétrons mais prótons mais nêutrons é um férmion, como o potássio-40.

A equipe de Jin descobriu uma maneira de contornar o comportamento anti-social dos férmions. Usou um campo magnético cuidadosamente aplicado para agir como "Cupido", passível de sintonia extremamente fina. O campo faz com que os átomos solitários encontrem pares, e a força dessas combinações pode ser controlada por meio de ajustes no campo magnético. Os átomos de potássio emparelhados de maneira fraca retêm parte de seu caráter fermiônico, mas também se comportam um pouco como bósons. Um par de férmions pode se fundir com outro par -e outro, e outro-, em um processo cujo produto final é um condensado fermiônico.

Jin suspeita que o sutil emparelhamento dos átomos em um condensado fermiônico seja o mesmo fenômeno de emparelhamento constatado no hélio 3, um superfluido. Os superfluidos fluem sem viscosidade, de modo que os condensados fermiônicos deveriam fazer o mesmo.

Um fenômeno estreitamente aparentado é o da supercondutividade. Em um supercondutor, elétrons emparelhados (os elétrons são férmions) podem fluir com resistência zero. Existe intenso interesse comercial nos supercondutores, que poderiam ser usados para produzir eletricidade mais barata e limpa e na construção de maravilhas de alta tecnologia como trens de levitação e computadores ultravelozes. Infelizmente, é difícil manipular e estudar os supercondutores.

Os condensados fermiônicos poderiam ajudar.

O maior problema dos supercondutores atuais é que -135 °C é a temperatura mais quente à qual qualquer um deles pode operar. O nitrogênio líquido ou outros fluidos criogênicos necessários a resfriar os cabos tornam qualquer aparelho que use supercondutores volumoso e caro. Os engenheiros prefeririam trabalhar com supercondutores que funcionem em temperatura ambiente.

"A força do emparelhamento em nosso condensado fermiônico, ajustada em termos de massa e densidade, corresponderia à de um supercondutor operando em temperatura ambiente", afirma Jin. "Isso faz com que eu seja otimista quanto à possibilidade de que os fundamentos físicos que aprendemos através dos condensados fermiônicos ajudarão outros estudiosos a projetar materiais supercondutores mais práticos".

A Nasa tem muitos usos para os supercondutores. Por exemplo, os giroscópios que mantêm a orientação dos satélites poderiam usar mancais sem fricção, feitos de imãs supercondutores, o que aumentaria sua precisão. Além disso, como os supercondutores são capazes de portar o mesmo volume de corrente que um fio de cobre, mas em um cabo muito fino, os motores elétricos a bordo de espaçonaves poderiam ser de quatro a seis vezes menores do que os atuais, economizando espaço e peso preciosos.

Outros especulam que os semicondutores poderiam desempenhar um papel em uma base lunar permanente, como a anunciada recentemente pelo presidente Bush em seu discurso sobre a futura exploração espacial tripulada. Os supercondutores seriam a escolha natural para geração e transmissão de energia com enorme eficiência, porque a temperatura ambiente despenca para -173 °C durante a longa noite lunar. E durante os meses de viagem que uma missão a Marte requereria, um aparelho de ressonância magnética portátil, que cabos supercondutores tornariam possível, seria uma forte ferramenta médica para ajudar a garantir a saúde da tripulação.

Lua. Marte. Não se pode sequer imaginar para onde os condensados fermiônicos nos levarão. Mas com certeza para além da escola secundária.

Nota do editor:
o texto menciona seis estados da matéria: sólido, líquido, gasoso, plasmático, BEC e condensado fermiônico. Os físicos debatem esse total. Seria possível acrescentar diversos outros estados, como os cristais líquidos, os vidros, os ferromagnetos, os paramagnetos e outros, à lista. Será que os condensados fermiônicos integram mesmo a lista dos estados da matéria? Ou seriam apenas uma subdivisão menos importante, como os cristais líquidos? A pergunta será respondida nos próximos meses e anos, à medida que os pesquisadores aprenderem mais sobre as propriedades dos férmions coalescentes.


Tradução: Paulo Migliacci

 

 

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