SÃO PAULO - Um problema de saúde na 
											família levou Alberto Ferreira, 
											presidente da SAP, a rever 20 anos 
											de planejamento de carreira.
No 
											dia 1o de agosto do ano passado, 
											Alberto Ferreira, de 43 anos, 
											assumiu em São Paulo a presidência 
											da unidade brasileira da SAP, 
											terceira maior empresa de software 
											do mundo. A chegada ao comando da 
											empresa alemã era a coroação de um 
											meticuloso planejamento de carreira, 
											iniciado 20 anos antes, quando 
											Alberto era um engenheiro 
											recém-formado e trabalhava na 
											Jonhson & Johnson na área de 
											informática. Na época, seu livro de 
											cabeceira era a autobiografia de Lee 
											Iacocca, ex-presidente da Chrysler, 
											um dos maiores best-sellers de todos 
											os tempos entre as publicações para 
											executivos. Alberto escreveu na 
											contracapa do livro um roteiro com 
											os postos que pretendia ocupar. A 
											meta era me tornar presidente de uma 
											grande empresa até 2009, diz.
											Todos os anos, Alberto revisava o 
											plano. Com o auxílio do 
											planejamento, especializou-se em 
											marketing e finanças. Conseguiu 
											construir uma bela carreira 
											executiva. Ocupou a vice-presidência 
											das operadoras de telefonia Intelig 
											e Vivo. Depois, optou pelo posto de 
											CEO da Carlson Wagonlit Travel, 
											agência de viagens do grupo Accor, 
											pelo desafio de promover uma 
											reestruturação. Em paralelo, exerceu 
											o empreendedorismo ao criar a marca 
											de cervejas Baden Baden, que vendeu 
											no ano passado para a Schincariol.
											Ao fechar com a SAP, Alberto 
											lembrou do plano de carreira. 
											Conquistei muita coisa na profissão 
											e na vida por causa desse plano 
											aqui, diz ele, apontando para o 
											livro remendado com fita adesiva. Só 
											que não houve tempo para 
											comemorações. Na manhã de 10 de 
											agosto, seu décimo dia de SAP, 
											enquanto Alberto dirigia seu carro 
											rumo ao escritório da empresa, sua 
											mulher, a relações-públicas Renata 
											Monte Alegre, de 38 anos, sofreu em 
											casa, no colo do filho, de 9 anos, 
											um acidente vascular cerebral. Numa 
											escala crescente de gravidade que 
											vai de 1 a 5, o nível do derrame de 
											Renata foi 4. Com a mulher 
											encaminhada para a UTI do Hospital 
											São Luiz, onde ficaria por um mês em 
											coma induzido, Alberto voltou a 
											atenção para o filho. Acalmou o 
											garoto e convenceu-o a ir para a 
											escola. Papai vai te buscar na hora 
											do almoço e te contar tudo o que 
											está acontecendo, disse na hora.
											SEM TEMPO DE ADAPTAÇÃO
					
											Mesmo se Alberto estivesse com a 
											vida pessoal em ordem, ingressar na 
											SAP não seria moleza. Ele recebeu a 
											missão de promover uma virada na 
											filial. O mercado das grandes 
											companhias, em que a SAP sempre 
											nadou de braçada, estagnou. O grande 
											desafio da fornecedora alemã é 
											emplacar uma versão compacta de seu 
											sistema de gestão entre as pequenas 
											e médias empresas. Para ter uma 
											idéia, após a entrada de Alberto, 
											40% das pessoas foram substituídas. 
											Com o incidente, aquela história de 
											primeiros 100 dias de adaptação foi 
											por água abaixo, recorda. Nas 
											reuniões, Alberto sentia que todos 
											respeitavam sua angústia, mas 
											evitavam se aproximar. Alguns sabiam 
											que seriam demitidos, diz.
											Para se concentrar no trabalho 
											durante os quase 50 dias em que 
											Renata esteve hospitalizada, Alberto 
											evitou imaginar como seriam a volta 
											e a recuperação da mulher. Deixei na 
											mão dos médicos. Sua rotina mudou. 
											Passou a levar o filho para a escola 
											e a chegar mais cedo em casa para 
											tomar suas lições. Pela ordem, suas 
											prioridades eram o filho e a mulher. 
											A empresa vinha depois. No fim de 
											setembro, os números não mentiram. 
											No fechamento de trimestre, a 
											empresa cumpriu apenas 48% da meta. 
											Foi o pior desempenho da minha 
											carreira, diz. Uma queda nas vendas 
											era esperada tanto pela transição de 
											comando quanto pela fase ruim do 
											mercado. Mas Alberto calcula que, se 
											não fosse o problema pessoal, o 
											resultado ficaria na casa dos 70%.
											Até então, o executivo vinha 
											resistindo à hipótese de se afastar 
											do cargo. Tinha lutado 20 anos para 
											chegar lá. Não ia desistir 
											facilmente, diz. Numa sexta-feira, 
											dia 28 de setembro, quando entregou 
											o péssimo número do trimestre ao 
											chefe, ele pensou em desistir. A 
											empresa não iria aceitar aquele 
											resultado novamente. Quando chegou 
											em casa à noite, derrotado, recebeu 
											duas boas notícias. Seu filho contou 
											que tinha garantido uma boa nota na 
											prova de ciências, para a qual 
											haviam estudado juntos. Três horas 
											depois, o telefone tocou. Era uma 
											pessoa do hospital dizendo que 
											Renata, que saíra do coma três 
											semanas antes, havia recebido alta. 
											Na segunda, voltei revigorado para a 
											SAP. Fizemos um resultado 
											extraordinário no quarto trimestre, 
											batendo as metas.
											Passados sete meses, a 
											recuperação de Renata surpreende até 
											os médicos. Ela retomou suas 
											atividades normais e voltou a 
											trabalhar. As seqüelas são leves. Do 
											episódio, a principal lição que 
											Alberto extraiu para a carreira foi 
											dar a dimensão exata para as coisas. 
											Quando você vive uma situação 
											dessas, os problemas de trabalho 
											ficam pequenos. Sua referência é 
											algo muito pior, diz. O plano de 
											carreira foi fundamental para 
											mantê-lo determinado a seguir em 
											frente. Se não tivesse um objetivo, 
											talvez eu desistisse. O que me 
											segurou foi o valor que dou para o 
											que já construí.